Avaliação das propriedades de uma argamassa com incorporação de conchas de sururu como agregado miúdo

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Alison Lopes da Silva
Emilia Rahnemay Kohlman Rabbani
Ariane da Silva Cardoso
Eliana Barreto Monteiro
Mahmoud Shakouri

Resumo

Na maricultura, aproximadamente 80% da produção de moluscos é descartada em forma de conchas (JOVIĆ et al., 2019). Em comunidades tradicionais que dependem da pesca de moluscos para subsistência, o descarte inadequado dessas conchas é comumente observado nos arredores dos locais de pesca. Um exemplo desse fenômeno ocorre na Ilha de Deus, uma comunidade pesqueira localizada em Recife, capital de Pernambuco, onde cerca de 408 toneladas de conchas de sururu e mariscos são descartadas anualmente ao ar livre (CARDOSO et al., 2023). Esse descarte agrava o desequilíbrio ambiental da área de manguezal onde a comunidade está inserida e representa potenciais riscos para a saúde dos moradores locais. Devido ao seu alto teor de carbonato de cálcio (CaCO₃) em sua composição química, as conchas de moluscos têm sido estudadas como possíveis alternativas para substituição de materiais na construção civil, especialmente cimento, areia e brita (MO et al., 2018). Diversos estudos utilizaram cascas de diferentes espécies de moluscos como substituto parcial do agregado miúdo em compósitos cimentícios, onde são observados diferentes resultados nas propriedades mecânicas do compósito produzido. Entretanto, a literatura é limitada quanto à incorporação de conchas de sururu como substituto da areia em compósitos cimentícios. O presente estudo teve o objetivo de avaliar os efeitos da substituição parcial da areia na argamassa por agregado de concha de sururu (ACS) nas propriedades mecânicas, visando reduzir o impacto ambiental na Ilha de Deus e explorar alternativas sustentáveis para a construção civil local. As conchas foram coletadas na Ilha de Deus, limpas em água corrente para retirada de restos de areia e insetos, seca em estufa a 100 °C ± 5 °C por 24 horas e em seguida peneiradas para retirada de matéria orgânica restante pós-secagem. Para utilização como ACS, as conchas foram trituradas em porções em um liquidificador doméstico de 900 W por 15 segundos para atingirem a finura e textura semelhantes à areia natural. Foi feito o peneiramento das conchas trituradas para retirada do material pulverulento passante na peneira n.º 200, e em seguida, foi feita a caracterização do material produzido. A dosagem da argamassa contou com o Cimento Portland CPII-Z-32 como ligante e areia na proporção 1:3, com a relação água/cimento de 0,55. Foram criados quatro diferentes traços, sendo um para referência sem incorporação do ACS e mais três com teores de 10%, 20% e 40% de substituição parcial da areia por ACS em massa. Foram produzidos 72 corpos de prova cilíndricos com 5 cm de diâmetro e 10 de altura, sendo 18 unidades para cada mistura. Os corpos de prova passaram pelos ensaios de consistência, densidade, resistência à compressão (aos 7 e 28 dias), módulo de elasticidade dinâmico e absorção de água por capilaridade. Através da caracterização do ACS, o material apresentou uma área de superfície específica de 2,66 g/cm³, um peso específico de 1453 kg/m³, um índice de vazios de 42%, absorção de água de 1,24% e uma quantidade de 97,86% de CaCO₃. A distribuição granulométrica do ACS se mostrou aceitavelmente nos limites estabelecidos pela NBR 7211 (ABNT, 2009). O índice de consistência demonstrou uma queda na trabalhabilidade das argamassas com incorporação do ACS, com redução de 6,4%, 16,4% e 31,5% do abatimento para 10%, 20% e 40% de substituição da areia, respectivamente. Isso se dá pela maior capacidade de absorção do ACS quando comparado com a areia natural. Quanto à densidade das argamassas, somente a com teor de 10% de substituição apresentou um leve aumento (2,22 g/cm³) quando comparado com a de referência (2,18 g/cm³). Já a de 20% e 40% apresentaram densidades menores, de 2,12 g/cm³ e 2,00 g/cm³, respectivamente. O formato angular do ACS possivelmente resulta no aprisionamento de ar nas argamassas, tornando-as menos densa que a de referência, como relatado por Cuadrado-Rica et al. (2016) e Martínez-García et al. (2017). Essa característica do ACS também parece afetar o módulo de elasticidade dinâmico da argamassa, resultando em uma redução de 0,9%, 13% e 42,6% em relação à de referência. O teste de resistência à compressão como um todo apresentou que a incorporação do ACS como agregado na argamassa resulta em menores resistências à compressão. Aos 28 dias de cura, as argamassas com 10%, 20% e 40% de ACS apresentaram redução de 2,7%, 17,6% e 43,7% respectivamente na resistência quando comparadas com a argamassa de referência. Essa redução pode estar ligada à natureza porosa das conchas, que compromete a aderência na zona de transição da pasta com o ACS. Diferentemente, a absorção por capilaridade da argamassa se mostrou beneficiada com a incorporação do ACS. Os teores de 10%, 20% e 40% de substituição reduziram em 46%, 12,4% e 2,1% a absorção por capilaridade, respectivamente. Em suma, este estudo evidenciou que a substituição parcial da areia pelo agregado de concha de sururu na produção de argamassa resultou em reduções na trabalhabilidade, módulo de elasticidade dinâmico e resistência à compressão. No entanto, também foi observada uma redução na absorção por capilaridade. Com base nos resultados obtidos, o teor de substituição de 10% foi considerado o mais adequado ao apresentar um desempenho satisfatório nos parâmetros avaliados. Até o teor de 20%, o ACS pode ser uma alternativa viável para a utilização em argamassas e concretos simples, desde que as influências identificadas neste estudo sejam devidamente consideradas e previstas durante o processo de projeto. Sugere-se que pesquisas futuras explorem outras proporções de substituição e investiguem a aplicabilidade dessas argamassas em diferentes contextos construtivos.

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Seção
Engenharia Civil