Estudo da degradação e composição química de azulejos de Athos Bulcão em equipamento modernista pernambucano

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Júlia Oliveira dos Santos
Eudes de Arimatéa Rocha
Joyce Kettly Soares da Silva
João Victor Farias Gomes da Silva
Pedro Henrique Cabral Valadares

Resumo

A produção azulejar modernista no Brasil, consolidada a partir da década de 40, representou um esforço para aliar expressividade estética a soluções construtivas racionais voltadas ao clima tropical. No Recife e Região Metropolitana, o arquiteto Armando de Holanda Cavalcanti adotou em seus projetos soluções que possibilitam sombreamento permanente, ventilação cruzada e modulação pré‑fabricada, articulando desempenho térmico e economia de meios. Em seu projeto do conjunto das lanchonetes do Parque Histórico Nacional dos Guararapes (1975), os painéis azulejados foram assinados por Athos Bulcão e passaram a sofrer com perda de material após décadas de pressão urbana, proveniente da progressão de habitações irregulares no entorno, abandono e consequente elevação da agressividade ambiental na área tombada onde estão situados. Diante da iminência reposição massiva dos azulejos, mediante ação judicial compensatória (Brasil, 2025), surgiu a necessidade de analisar as anomalias visuais e, com base na caracterização da composição elementar, subsidiar intervenções que se configurem compatíveis, duráveis e menos suscetíveis à reincidência de falhas. O estudo, de caráter investigativo e abordagem qualiquantitativa, realizou inspeção técnica durante visitas em abril de 2025, nas quais foram coletados fragmentos azulejares desprendidos. Um dos exemplares, ainda aderido à argamassa colante e que pertencia à uma das lanchonetes, foi levado a laboratório, onde foi realizada limpeza e delaminação das camadas (vidrado, chacota e argamassa), e então submetido ao ensaio de Fluorescência de Raios X com o equipamento S1 Titan da Bruker. Configurado para restricted materials, operou com dois modos de excitação e colimador de 8 mm, com leituras de 60 segundos. Os resultados confirmam azulejos de produção industrial e indicam vidrados plumbíferos, à base de sílica (Si), chumbo (Pb) e zircônio (Zr), que configuram brilho, aderência e durabilidade no esmalte, segundo Gill; Rehren (2017). Entretanto, quantidades diferentes de cobalto (Co) confirmaram o desbotamento nos tons de azul, que em comparação ao teor de zinco (Zn) em quantidades contrastantes no esmalte branco, evidenciam alteração cromática que pode estar associada à vulnerabilidade do óxido de zinco (ZnO) em ambientes sombreados e muito úmidos, como sinaliza Reinosa et al. (2022). Ainda no vidrado, foram identificadas colonizações biológicas em trechos superiores e ocorrência de fissuras e crostas de fuligem nos inferiores, associadas à ação de queimadas frequentes muito próximas aos painéis, provocando uma incompatibilidade termoexpansiva entre esmalte e chacota. A perda do vidrado foi constatada em outros conjuntos mais recentes edificados no Parque dos Guararapes, e alertam para fragilidades na zona da interface dos azulejos, que podem ser promovidas por reações internas do elemento e exposição ambiental local. Para a argamassa colante, considerou-se que foi produzida em obra com agregados locais, dado cenário pré-industrialização do material no Brasil, porém o teor de cloro (Cl) presente na amostra sugere a presença de cloretos, que podem estar favorecendo fissurações e perda de aderência das peças, representando um fator de risco segundo Silva et al. (2024) e Drougkas et al. (2025). Este cenário compromete o desempenho do subsistema de revestimento, uma vez que partes onde já havia sido documentada perda do material anos antes seguem expostos a intempéries e práticas inadequadas de uso, como vandalismo, grafitagem, impactos mecânicos e queima de depósitos. O resultado é desagregação da argamassa, fissuras, eflorescência e formação de biofilmes, indicando instabilidade físico-química do conjunto, onde a simples substituição das peças contraria medidas conservativas, pois a NBR 13755 (ABNT, 2017) condiciona esta prática à plena integridade do sistema existente. Constatou-se, portanto, que o estado de degradação da edificação resulta da sinergia entre formulações suscetíveis à lixiviação de material, contaminações e ciclos higrotérmicos exacerbados e, portanto, recomenda-se ampliar o diagnóstico com ensaios como Difração de Raios X (DRX) para identificar as fases cristalinas no material, e Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) para constatar vazios ou vulnerabilidades na interface vidrado-chacota. Tais medidas podem contribuir com estratégias de remoção ou estabilização material, uma vez que identifica precisamente as camadas contaminadas e reforça a participação de análises técnicas laboratoriais em soluções precisas. Por fim, a interdisciplinaridade surge como uma alternativa de contenção ao desaparecimento de um testemunho singular da arquitetura modernista adaptada ao clima do Nordeste, cuja conservação exige sensibilidade técnica e responsabilidade histórica.
 

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Seção
Engenharia Civil