Análise de Consumo de Energia Elétrica de Equipamentos em Oficina de Pintura Automotiva

 

Consumption Electrical Energy Forecast for an Automotive Paint Shop

 

Rafael Oliveira1  
 orcid.org/0009-0005-8841-763X 



Paulo Couto1 
 orcid.org/0009-0005-4891-173X 

Thiago Cavalcanti1
 orcid.org/0009-0002-0499-2521

 

Victor Kirschner1  
 orcid.org/0009-0001-1200-6544 



Fausto Lorenzato1 
 orcid.org/0000-0002-1150-4904 

Alexandre M. A. Maciel1
 orcid.org/0000-0003-4348-9291


 

1Escola Escola Politécnica de Pernambuco, Universidade de Pernambuco, Recife, Brasil. E-mail: rafaelbarbosa.oliveira@upe.br

 

DOI: 10.25286/repa.v9i1.2780

 

Esta obra apresenta Licença Creative Commons Atribuição-Não Comercial 4.0 Internacional.

 

Como citar este artigo pela NBR 6023/2018: Rafael Oliveira; Paulo Couto; Thiago Cavalcanti; Victor Kirschner; Fausto Lorenzato; Alexandre M. A. Maciel. Análise de Consumo de Energia Elétrica de Equipamentos em Oficina de Pintura Automotiva. Revista de Engenharia e Pesquisa Aplicada, v.9, n. 1, p. 69-78, 2024. DOI: 10.25286/repa.v9i1.2780

 

 

RESUMO

 

Este artigo tem como objetivo principal prever o comportamento do consumo de energia elétrica em uma oficina de pintura localizada dentro de uma fábrica automotiva de caráter industrial. A abordagem de previsão de séries temporais adotada foi baseada na otimização de processos de modelos preditivos. As métricas para a seleção dos modelos foram MAPE e MSE. Os resultados produziram uma arquitetura de modelos capazes de produzir insights valiosos sobre os padrões de consumo de energia, levando consideração as interações complexas entre os equipamentos. A solução proposta proporcionou uma base sólida para a construção de modelos robustos e precisos, contribuindo para uma gestão eficiente do consumo de energia na oficina de pintura industrial.

 

PALAVRAS-CHAVE: Energia; Indústria; Manufatura; Séries Temporais.

 

ABSTRACT

 

This article aims to predict the behavior of electricity consumption in a painting workshop located within an industrial automotive factory. The adopted time series forecasting approach was based on the optimization of predictive model processes. Metrics for model selection included MAPE and MSE. The results yielded a model architecture capable of providing valuable insights into energy consumption patterns, considering the complex interactions among equipment. The proposed solution laid a solid foundation for the construction of robust and accurate models, contributing to efficient management of energy consumption in the industrial painting workshop.

 

KEY-WORDS: Energy; Industry; Manufacturing; Time Series.

 


 


1 INTRODUÇÃO

 

O crescente foco na eficiência energética na indústria automotiva impulsiona a necessidade de uma análise aprofundada do consumo de energia em oficinas de pintura.

O procedimento de pintura automotiva abrange diversas fases interdependentes, começando pela criação de um ambiente de produção controlado. Essas etapas incluem a manipulação de componentes químicos, como bases, tintas, solventes e catalisadores, juntamente com a calibração e coordenação automática de atuadores responsáveis pela aplicação da pintura.

Todo o processo culmina na inspeção de qualidade do produto final. A obtenção de uma pintura de alta qualidade está diretamente ligada à harmonia e sincronia entre essas etapas iniciais. O sucesso nesse percurso resulta em uma taxa aceitável de qualidade para o produto final, sendo essa avaliação realizada no setor automotivo por meio de inspeção visual em pontos específicos da linha de produção, determinando a aprovação ou rejeição do veículo [1].

Autores afirmam que o processo de pintura é responsável por grande parte do consumo total de energia elétrica nas fábricas [11], podendo representar até 50% do consumo total de energia em uma fábrica automotiva e custar 10% da produção de um automóvel [12].

 

1.1 DESCRIÇÃO DO PROBLEMA

 

A indústria automotiva tem a característica de ser altamente automatizada. Diversos processos são completamente realizados na construção do produto sem a intervenção humana. O alto nível de automação e a complexidade dos processos envolvidos necessitam de inúmeras máquinas e consequentemente elevado consumo de energia que a torna responsável por uma grande parte do consumo de energia no mundo. A falta de eficiência na etapa de pintura pode levar a um consumo excessivo de energia, aumentando os custos de produção e os impactos ambientais da indústria automotiva.

Entre os fatores que podem impactar no consumo energético no processo de pintura: a temperatura e umidade ambiente que podem ter um impacto significativo no tempo de secagem e cura da tinta; a pressão excessiva de ar que pode resultar em desperdício de tinta e maior consumo de energia, enquanto uma pressão baixa pode levar a uma qualidade de acabamento inferior; os equipamentos de pintura, como pistolas de pintura e cabines de pintura, também podem afetar a eficiência energética e a análise dos dados desses equipamentos podem contribuir para as avaliações de seus desempenhos em cada etapa do processo [8].

Cabe ressaltar aqui a importância dos impactos ambientais. Segundo Pedrosa e Corgosinho (2019) [5], os anos 1960 e 70 marcaram um período de intensas discussões sobre questões ambientais, impulsionando o crescimento do ambientalismo público e a sensibilidade social para essas preocupações, especialmente durante a grande contestação dos anos 1960. Um marco emblemático dessa expansão ocorreu em abril de 1970, conhecido como o Dia da Terra, quando 300 mil pessoas nos EUA se uniram em uma manifestação ecológica.

O surgimento desse ativismo ecológico e político exigiu respostas da institucionalidade oficial. A necessidade de oficializar o discurso ambiental surgiu da urgência em comunicar à opinião pública a ideia de que o mundo não estava fora de controle. Essa iniciativa começou a se concretizar em 1972, na Itália, quando o recém-criado Clube de Roma apresentou o relatório "Limites do Crescimento". A partir desse momento, sucederam-se conferências internacionais sobre o tema. O conceito de desenvolvimento sustentável entrou na agenda ambiental em 1987, quando o relatório Brundtland ("Nosso Futuro Comum"), elaborado a pedido das Nações Unidas (ONU), delineou uma agenda global para a mudança. Em 1984, o tema ganhou destaque na influente Câmara do Comércio Internacional, marcando seu ingresso na agenda empresarial. Esses eventos ilustram a evolução das preocupações ambientais desde suas origens até a incorporação de abordagens sustentáveis nos setores econômicos e empresariais, refletindo uma mudança progressiva nas perspectivas para lidar com os desafios ambientais globais [5].

A incorporação do discurso ambiental na indústria automobilística é notavelmente tardia e, em grande medida, reativa, manifestando-se como uma forma de comunicação considerada apropriada para o contexto. É importante destacar que um discurso apropriado não significa uma mera cópia, mas sim uma adaptação ou ressignificação. Por meio desse processo, a indústria se apropria do discurso ambiental existente, atualizando-o de acordo com as demandas atuais, conferindo-lhe um novo significado [5]. Em outras palavras, o discurso é remodelado para refletir as necessidades do presente, alinhando-se com um cenário idealizado."

Em síntese, a pintura automotiva emerge como uma peça-chave na complexa engrenagem da indústria automobilística, enfrentando desafios energéticos e ambientais consideráveis. A automatização intensiva característica do setor, embora promova eficiência, demanda uma quantidade expressiva de energia, tornando-se uma faceta central no panorama global do consumo energético

Entretanto, vislumbra-se um horizonte promissor permeado por soluções tecnológicas avançadas e uma crescente conscientização ambiental. À medida que a indústria se adapta ao discurso sustentável, a pintura automotiva surge não apenas como uma etapa crítica na fabricação de veículos, mas como um campo de oportunidades para inovações que aliam eficiência operacional à responsabilidade ambiental. O futuro da pintura automotiva se desenha como um capítulo onde a harmonia entre qualidade, eficiência e sustentabilidade ditará o curso da indústria, impulsionando-a em direção a um modelo mais equilibrado e alinhado com as expectativas contemporâneas.

 

1.2 JUSTIFICATIVA

 

O uso de tecnologias inovadoras pode reduzir o consumo e os custos operacionais nesta etapa de manufatura do veículo gerando benefícios econômicos e ambientais tais como a redução dos custos operacionais totais e específicos, ao aumento da produtividade e a redução das emissões de gases de efeito estufa.

Um trabalho com técnicas metodológicas robustas possibilitam explorar oportunidades para reduzir o consumo de energia no processo de pintura, sem comprometer a qualidade do produto final; fazer benchmarking de projetos e soluções a partir de análises em casos de sucesso de empresas que já adotaram medidas de eficiência energética em seu processo de pintura e os benefícios obtidos; explorar as tecnologias disponíveis atualmente para melhorar a eficiência energética na pintura automotiva e discutir seu potencial de adoção em larga escala.

 

1.3 OBJETIVOS

O objetivo geral da proposta é desenvolver uma arquitetura de modelos de inteligência artificial como Analytic de predição e otimização de cenários promotores de eficiência no consumo de energia da Unidade Operativa de Pintura potencializando a produtividade, redução de custos de produção e a sustentabilidade.

Em relação aos objetivos específicos podem ser citados:

·        Levantar base de dados de consumo dos vetores e ciclos de produção;

·        Extrair, Transformar e Carregar os dados em uma database - Extract, transform, load (ETL);

·        Realizar Análise Exploratória de Dados - Exploratory Data Analysis (EDA);

·        Avaliar um possível impacto no consumo devido a cada modelo produzido;

·        Desenvolver modelos de predição com base nas diferentes grandezas que impactam no consumo;

·        Construir arquitetura com os melhores modelos de predição e otimização para a Unidade Operativa de Pintura

 

1.4 ESCOPO NEGATIVO

 

Com base nos dados disponíveis, assume-se:

·        Dado o baixo impacto no consumo energético da Pintura, não será considerado o consumo de energia do vetor ar comprimido;

·        Para o estudo são considerados apenas dados coletados entre os dias 01/01/2023 e 30/09/2023.

 

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

          

Compreender o processo de manufatura industrial é essencial para abordar os desafios relacionados à Unidade Operativa de Pintura. Diversos estudos publicados fornecem apoio tanto para uma compreensão abrangente quanto para abordagens específicas desses desafios.

 

2.1 MANUFATURA INDUSTRIAL

 

Manufatura industrial é a área que se relaciona com a aplicação de processo para a transformação do produto ao longo da linha produtiva. Esta transformação ocorre por meio do consumo de vetores energéticos.

A Unidade Operacional da Pintura é o objeto de estudo deste trabalho. A área da Pintura é a parte do processo responsável por receber a carroceria do veículo montada e soldada sem componentes oriunda do processo da Funilaria e entregar ao próximo cliente do processo que é a unidade da Montagem por meio de um produto que é a carroceria limpa de impurezas, quimicamente tratada e com aplicação de toda sua pintura.

No contexto das organizações de manufatura, é essencial empregar uma variedade de técnicas e ferramentas para atingir seus objetivos fundamentais. Nesse sentido, a utilização de técnicas de aprendizado de máquina-Machine Learning (ML) representam uma abordagem altamente benéfica para abordar os desafios enfrentados na indústria de fabricação [7].

Mineração de dados envolve a identificação de padrões, informações significativas e conhecimento latente em extensos conjuntos de dados. Através da aplicação de técnicas estatísticas, aprendizado de máquina e análise de dados, ela facilita a extração de valiosos insights que podem orientar a tomada de decisões, realizar previsões e reconhecer tendências em uma variedade de campos, abrangendo desde o mundo dos negócios até a pesquisa científica e a medicina [4]. É uma ferramenta de grande eficácia na transformação de dados brutos em informações que possam aprimorar processos e resultados.

 

2.2 TÉCNICAS DE MACHINE LEARNING

 

2.2.1 Random Forest

É um conjunto de árvores de decisão com aleatoriedade nas escolhas de características onde são criadas múltiplas árvores de decisão durante o treinamento e combina seus resultados para melhorar a precisão. Deste modo, os dados são divididos em conjuntos menores e assim processados em paralelo, através do Método de Bagging. Dada a sua facilidade de uso aliada ao tratamento de grandes conjuntos de dados, é comumente utilizado em ciência de dados, análise de crédito e marketing entre outros.

 

2.2.2 XGBoost

Abreviação para Extreme Gradient Boosting, ou Aumento de Gradiente Extremo, em livre tradução. É um algoritmo que otimiza o desempenho e a generalização. Constrói uma série de modelos de árvores de decisão sequencialmente, onde cada modelo tenta corrigir os erros do anterior com o intuito de criar um modelo preditivo mais robusto. Este algoritmo é amplamente aplicável em cenários de múltiplos dados e complexos. Sua aplicação é observada em campos de finanças, ciência de dados e previsões diversas.

 

2.2.3 Deep Learning

É uma abordagem de aprendizado de máquina que utiliza redes neurais profundas para aprender representações complexas dos dados. Essas redes são capazes de aprender automaticamente a partir dos dados, sem a necessidade de características manualmente projetadas. As redes neurais artificiais são o cerne do Deep Learning, e são estruturas em camadas compostas por nós ou neurônios interconectados.

O Deep Learning é capaz de reconhecer padrões complexos em dados, como imagens, textos e sons, para apresentar novas interpretações e previsões precisas. Além disso, o treinamento de algoritmos de aprendizado profundo requer grandes volumes de dados e recursos significativos. Essa técnica é inspirada no funcionamento do cérebro humano, com milhões de neurônios interconectados. As redes neurais de aprendizado profundo são altamente complexas e possuem estruturas como memória de longo prazo, enquanto as redes neurais tradicionais são trabalham com apenas algumas camadas.

 

2.2.4 LSTM - Long Short Term Memory

Memória longa de curto prazo, em livre tradução, é um tipo de rede neural recorrente (RNN) que consiste em células de memória (com portas de entrada, saída e esquecimento) que permitem que a rede aprenda a lembrar e esquecer informações relevantes ao longo do tempo, o que permite lidar com o problema de dependências de longo prazo.

São eficazes para aplicações de sequência de dados, como tradução automática, e previsão de séries temporais, o que as tornam úteis para situações nas quais necessitamos de compreensão de contextos mais abrangentes.

 

2.1.5 Algoritmo Genético

O Algoritmo Genético tem sua inspiração na teoria de Charles Darwin da evolução das espécies e na seleção natural. É usado comumente em pesquisas de ciência de dados, inteligência artificial e operações para solução de problemas de otimização.

Durante a aplicação do algoritmo ele repete as etapas de cruzamento dos seus genes dentro de uma população de dados até o refinamento da solução ser encontrado. Pode ser aplicado em otimização de hiperparâmetros para algoritmos de machine learn ou desafios em que busca-se valores ótimos a partir de vetores numéricos ideais encontrados (ex: para uma saída z otimizada de uma função, são definidos os melhores valores para o vetor [x, y]).

 

2.2 TRABALHOS RELACIONADOS

 

Uma nova abordagem para otimizar o agendamento de sequências de pintura na indústria automotiva é reduzir o tempo de produção e aumentar a eficiência do processo de pintura. O algoritmo proposto combina os pontos fortes do algoritmo Partheno-Genetic Algorithm, que usa heurísticas para gerar novas soluções e estratégias adaptativas que permitem a modificação dos parâmetros do algoritmo durante o processo de otimização. O algoritmo leva em consideração vários fatores, como as características do processo de pintura, a disponibilidade de recursos e a sequência das operações de pintura. A abordagem proposta foi testada em um estudo de caso envolvendo a programação de sequências de pintura em uma fábrica automotiva [12].

Existe também uma metodologia para ajustar um modelo matemático de um forno de cura de tintas utilizado na indústria de pintura automotiva. O ajuste do modelo é feito através da determinação dos coeficientes de transferência de calor por convecção com base em dados industriais. Essa modelagem ajustada é então utilizada para prever como o forno irá se comportar em novos cenários operacionais, especialmente no contexto do forno Elpo, que é amplamente utilizado nesses processos de pintura. Os resultados sugerem que a metodologia proposta pode ser aplicada como uma ferramenta eficaz para desenvolver estratégias de otimização operacional. Essas estratégias visam reduzir retrabalhos e os custos de energia associados ao funcionamento do forno, ao mesmo tempo em que garantem a qualidade da pintura produzida [2].

Outro estudo é um modelo matemático com o propósito de simular os fluxos de energia em fornos de pintura automotiva. Esse modelo oferece a capacidade de analisar minuciosamente o impacto de diversas variáveis sobre os parâmetros operacionais críticos, como a temperatura do ar e a temperatura das carrocerias dos veículos durante o processo de pintura. Os resultados deste estudo indicam que a aplicação deste modelo pode facilitar a seleção criteriosa de parâmetros operacionais ideais para o projeto de novos fornos de pintura ou para o aprimoramento dos já existentes [6].

Também há a proposta de uma abordagem inovadora no processo de pintura automotiva, que utiliza Redes Neurais para melhorar o controle de temperatura em um forno Elpo usado na eletrodeposição de peças de carroceria (BIW - Body in White). Foi desenvolvido um sistema de Controle Preditivo por Redes Neurais (NNPC - Neural Network Predictive Control) treinado com dados gerados por um modelo fenomenológico. O NNPC prevê as temperaturas futuras do BIW e otimiza os sinais de controle com base no modelo de Controle Preditivo Generalizado. Simulações demonstraram que essa abordagem mantém as temperaturas controladas próximas aos valores desejados, melhorando a qualidade da pintura [3].

 

3 MATERIAL E MÉTODOS

          

Apresenta-se os recursos utilizados e resultados iniciais na base de dados, bem como as definições dos modelos propostos para a construção da arquitetura planejada no objetivo deste estudo.

 

3.1 DESCRIÇÃO DA BASE DE DADOS

 

As bases de dados para as modelagens neste estudo incluem o dataset de Consumo, com dados de máquinas, processos e consumo de energia em kilowatts-hora (kWh), e o dataset de Produção com dados de máquinas, processos e quantidade produzida de veículos (ciclos). Todos os dados foram coletados ao longo de intervalos de tempo variáveis, que compreendem minutos, horas, dias, meses e anos, com amostras registradas entre 3 a 10 minutos.

Ambos os conjuntos de dados contêm registros de mais de 100 máquinas localizadas na oficina de pintura, onde os dados de ciclos e kWh são extraídos. Máquinas representam o nível mais micro da coleta de dados. Em um nível mais macro, estão os processos que são os agrupamentos nos quais as máquinas estão situadas, representando as etapas do processo na oficina de pintura. Entre esses processos, incluem-se banho, ventilação, caldeira, água demi, forno, retificador, tratamento, transportador, tinta e iluminação, sendo comum a ambas as bases de dados. Os dados de kWh representam o consumo energético de gás e energia elétrica das máquinas, coletados em intervalos de 3 minutos. Quanto aos ciclos, que indicam a quantidade produzida, referem-se ao número de veículos produzidos dentro do referido período de tempo.

Assim, o dataset fornece informações específicas sobre o consumo de vetores energéticos (gás e energia elétrica em KWh), contendo 18.715.556 registros, cada um com 10 características (atributos). Por outro lado, o dataset da de produção compreende dados relacionados à contagem de produção da linha de produção, com 4.289.137 registros.

 

3.2 ANÁLISE DESCRITIVA DOS DADOS

 

A consolidação das duas bases de dados foi realizada por meio do processo ETL no ambiente Pentaho¹, visando criar um histórico unificado de dados em um banco de dados SQL com amostragem em intervalos de 15 minutos. Esse procedimento resultou em um conjunto de dados composto por pouco mais de 3 milhões de linhas, abrangendo o período de janeiro a setembro do ano em curso.

 

CAMPO

TIPO

TAMANHO

VALORES

Data

Timestamp

datetime64

a cada 15 min

Tipo Energia

String

Object

EE e GAS

Máquinas

String

Object

cod máq

Consumo

Float

float64

KWh

Ciclos

Int

float64

0 a 15

 

A concatenação das bases possibilitou uma visualização unificada do consumo e produção na oficina de pintura, viabilizando análises e outras aplicações pertinentes ao escopo desta pesquisa.

 

3.3 PRÉ-PROCESSAMENTO DOS DADOS

 

O pré-processamento é de grande relevância na busca de compreensão das variáveis, permitindo realizar uma análise crítica em relação aos objetivos deste estudo. Ao examinar as variáveis, notou-se, conforme ilustrado na Figura 1, a presença de valores ausentes (null) na variável "ciclos". Segundo a orientação do stakeholder do processo, esses valores nulos correspondem a ciclos com contagem igual a 0.

 

Figura 1 - Dados null na ciclos

Fonte - Autores

 

Como parte do procedimento de tratamento de dados, os valores nulos foram substituídos por zero, a fim de preservar a integridade da análise e ajustar a variável às especificações fornecidas. Para a exploração e levantamento de outras transformações necessárias, utilizaram-se técnicas de EDA. O foco do estudo ocorreu em nível mais macro e para tanto o dataset foi reestruturado (pivot_table). Os índices foram os timestamp, indicando que cada amostra foi usada com intervalo de 15 minutos, os processos se tornaram as colunas (features do estudo), com valores de KWh e a variável alvo é cíclo. Aplicou-se, como análise bivariada, o violinplot verificou se os seguintes resultados:

 

Figura 2 - Violinplot Processos X KWh

Fonte - Autores

 

As observações exibem uma diversidade de padrões, incluindo valores outliers que têm o potencial de impactar a performance dos modelos de machine learning (ML). Este cenário aponta para a possibilidade de que modelos menos sensíveis a outliers possam apresentar um desempenho mais eficaz. Esta consideração, a priori, orientou a seleção de algoritmos como Random Forest, Deep Learning e LSTM (Long Short Term Memory) a serem aplicados neste projeto. Optou-se por aplicar também o XGBoost (Extreme Gradient Boosting), modelo mais sensível a outliers para comparação de desempenho e eficácia com os demais modelos.

Os modelos finais neste estudo foram desenvolvidos utilizando um conjunto de dados no qual foram excluídas as variáveis "água demi", "caldeira" e "iluminação". As duas primeiras foram eliminadas devido à sua baixa correlação de Pearson com as demais variáveis, registrando um nível inferior a 0,5. A exclusão da variável "iluminação" foi fundamentada no conhecimento fornecido pelo stakeholder. A exclusão dessas variáveis resultou em um dataset com sete variáveis de KWh e uma variável de ciclos.

A estratégia de seleção de variáveis foi implementada com base em uma avaliação criteriosa, visando otimizar a eficiência dos modelos finais e assegurar a relevância das variáveis incorporadas ao estudo. Por fim, aplicou-se o Algoritmo Genético: otimizador implementado com o objetivo de apresentar uma arquitetura completa de análise preditiva.

 

4 METODOLOGIA EXPERIMENTAL

Empregou-se uma abordagem estratégica composta por três fases para conceber uma aplicação capaz de atender aos propósitos delineados na pesquisa, ao mesmo tempo em que proporciona resultados analíticos de valor quando implementada em ambiente produtivo.

Para os steps 1 e 2, o dataset foi normalizado para valores entre 0 e 1. A proporcionalidade de divisão da base de dados para input e output foi de 80% para treino e 20% para teste. O step 3 recebe como input os valores de saída do step 1 e o modelo de melhor eficácia no step 2.

 

Figura 3 - Arquitetura com três etapas de modelagem

 

Fonte – Autores

 

4.1 Step 1 - Séries temporais

O dataset foi utilizado como dados de séries temporais com a finalidade de produzir predições de consumo em um tempo de t+1 (onde t é o tempo de referência atual). Nesta etapa foram modelados três algoritmos conforme apresentado na Figura 3. A entrada de cada modelo consiste em um conjunto de seis amostras (cada amostra representa uma linha do dataset com sete valores de KWh referente aos sete processos que permaneceram no dataset), totalizando 42 entradas, com o objetivo de prever sete valores de consumo de energia para uma saída futura. Os hiperparâmetros de todas as arquiteturas foram determinados por meio da aplicação da função ParameterGrid da biblioteca scikit-learn, a qual é utilizada para iterar sobre combinações de valores de parâmetros.

Os modelos Random Forest e XGBoost foram configurados com base na minimização do Erro Médio Quadrático (MSE), sendo escolhidos os conjuntos de hiperparâmetros que apresentaram os menores valores para o MSE. Os hiperparâmetros selecionados foram: max_depth =None,min_samples_leaf=6, in_samples_split=10 e n_estimators=50.

Para a abordagem com a técnica LSTM, optou-se por uma arquitetura composta por duas redes neurais recorrentes e uma camada densa com 64 neurônios, na qual cada neurônio se conecta a todos os neurônios da camada subsequente, e uma camada de saída. Os hiperparâmetros selecionados foram os seguintes: 128 neurônios na primeira camada, 64 neurônios na segunda camada e 20 neurônios na camada densa. Utilizou-se a função de ativação tangente hiperbólica na primeira e segunda camadas, sigmoide na camada densa e relu na camada de saída. O otimizador escolhido foi o ADAM, a função de perda adotada foi o Erro Médio Quadrático (MSE), e o tamanho do lote (batch_size) foi definido como 16, um total de 400 épocas e evoluções internas igual a 20.

 

4.2 Step 2 - Regressão

Nesta etapa, o mesmo conjunto de dados empregado na etapa anterior foi utilizado como conjunto de dados tabulares para a resolução de um problema de regressão. Os modelos propostos têm como objetivo proporcionar uma estimativa numérica mais precisa, representada por um valor float igual ou próximo ao número real de ciclos produzidos na oficina de pintura. Para alcançar tal objetivo, foram explorados modelos com sete features de entrada e uma de saída. As sete features correspondem aos valores de consumo de energia em cada um dos processos, enquanto a variável de saída representa a quantidade de ciclos produzidos associados aos referidos consumos.

As configurações dos modelos Random Forest e XGBoost foram mantidas inalteradas, seguindo as especificações mencionadas na fase anterior. A única modificação realizada foi na definição das entradas e saídas, conforme detalhado no parágrafo anterior. Quanto à abordagem de deep learning, as configurações de arquitetura e de hiperparâmetros consistem em quatro camadas densas ocultas e uma camada de saída.  A função de ativação adotada foi a relu para a camada de saída, enquanto nas demais camadas foi empregada a função sigmóide. As definições do otimizador, função de perda, batch_size e épocas foram os mesmos definidos para a LSTM.

 

4.3 Step 3 - Otimização

Com o propósito de otimizar o vetor energético previsto na etapa 1, implementou-se o Algoritmo Genético (AG) ou Genetic Algorithm (GA). Com os resultados desta fase, acredita-se que um especialista terá a capacidade de avaliar quais os valores de consumo energético preditos para o próximo tempo futuro e quais seriam esses valores ótimos, mantendo ou incrementando o nível de produção de ciclos.

Para isto, o AG recebeu como função fit o melhor modelo gerado no step 2. O vetor predito na etapa 1 foi utilizado como vetor inicial para a geração dos novos indivíduos da primeira população. O número de iterações foi fixado em 200, o tamanho da população em 30, a taxa de mutação estabelecida em 0,01, o elitismo em 0,1, a taxa de cruzamento em 0,7, a taxa de parentes da geração anterior é de 0,3 e o cruzamento é de um ponto de corte.

Como delimitador dos vetores dos novos indivíduos gerados foi estabelecido, conforme informação do stakeholder, que os cruzamentos e mutações geram números iguais ou até 20% menores que os valores da respectiva célula de origem.

 

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

 

Nesta seção examinaremos os resultados, discussões e insights das aplicações realizadas durante esta investigação de consumo de energia de equipamentos na oficina de pintura automotiva.

Dadas as grandezas e unidades das respostas dos algoritmos, os resultados foram apresentados sob métricas distintas, MAPE (Erro Percentual Médio Absoluto) e MAE (Erro Médio Absoluto) para o step 1 e step 2 respectivamente. Facilitando assim a leitura pelos stakeholders de perfil gerencial.

 

5.1 Step 1 - Séries temporais

Os algoritmos de séries temporais LSTM e XGBoost deram resultados similares, com MAPE de 8,5%, a escolha pelo LSTM como algoritmo adequado para o step 1 se deu pela sua reconhecida aderência ao contexto de previsão de séries temporais. O modelo Random Forest teve resultado MAPE de 10%. Um resultado cerca de 18% pior que os dois algoritmos anteriores.

 

5.2 Step 2 - Regressão

De forma similar ao step 1, no step 2 também ocorreu empate entre algoritmos com Random Forest e Deep Learning atingindo erro MAE de 1,58 ciclos, já o XGBoost teve erro levemente superior atingindo 1,64 ciclos de erro na previsão, sendo este último pior em cerca de 3,8%. A escolha do step 2 foi pelo algoritmo de Deep Learning. Com o objetivo de explorar outras modelagens de aperfeiçoamento.

 

5.3 Step 3 - Otimização

Como algoritmo de otimização foi utilizado apenas o Algoritmo Genético. Este apresentou uma evolução com incremento no número final de de ciclos produzidos, saltando de 11,6 para cerca de 13,2, considerando a otimização da relação entre vetor de consumo e produção em ciclos.

5.4 Arquitetura de modelos de predição e otimização final

 

A seleção final dos algoritmos para os steps 1, 2 e 3 foi respectivamente LSTM, Deep Learning e Algoritmo Genético, destacados na Figura 4.

 

 

Figura 4 - Arquitetura com três etapas de modelagem e caminho maior eficácia

Fonte - Autores

 

A seguir, apresenta-se a execução completa da arquitetura proposta (que ocorre no step 3 com a execução do AG), conforme ilustrado na Figura 4.

 

1.      Inicialização da População:

·        P={G1 ,G2 ,…,GN}

·        =[ [1],Gi[2],…,Gi[L]], onde:

·         é um indivíduo (solução candidata) na geração i. Todos os indivíduos foram gerados a partir do vetor de saída da LSTM produzida no step 1.

·        P é a população inicial de soluções candidatas.

·        [j] = j-ésimo gene do indivíduo .

·        L = comprimento do cromossomo (número de genes).

 

2.      Função de Aptidão (Fitness Function):

·        f (G) é a função de aptidão que avalia a qualidade de uma solução candidata G. Neste estudo f () é o modelo de DL criado no step 2.

 

3.      As fases subsequentes de execução AG compreendem seleção, cruzamento, mutação e substituição da população, seguindo os padrões estabelecidos na literatura e os hiperparâmetros mencionados anteriormente.

 

5.5 DISCUSSÃO

 

Uma vez que todo o ciclo de steps venha a ser executado, a resposta final do modelo dará ao analista do processo de pintura subsídios para identificar qual dos processos é o que apresenta maior ineficiência energética. Uma vez que será possível comparar a previsão do ciclo futuro de produção e consumo de energia com a resposta do Algoritmo Genético que trará o resultado de consumo energético ótimo com base nos dados presentes na base de dados em questão.

 

6 CONCLUSÕES

 

O aumento de eficiência energética final não será guiado pelo foco em ações nos equipamentos e processos que apresentam apenas maior consumo energético, será sim orientado para a identificação daqueles equipamentos e processos que apresentam maior ineficiência energética combinada com maior consumo de energia. Esta nova ótica representa uma mudança de paradigma de foco apenas no maior consumidor para foco no mais ofensor, sendo este último apresentado produzido com base nos modelos de inteligência artificial aqui desenvolvidos.

É possível melhorar a acurácia dos modelos com aprofundamento do estudo. Há uma série de ações já podem ser implementadas no curto prazo que trariam usos diferentes das previsões e/ou maior acurácia destas. Entre elas temos:

·        Foi adotado como base de tempo a janela de 15 minutos para agrupamento dos registros coletados. Aumentar a base de tempo para intervalo de dados em hora, dia, semana, etc. trará um outro entendimento sobre os dados e estima-se que tenha uso para uma abordagem mais gerencial com foco na predição de consumo energético.

·        Foram agrupados em processos a totalização de consumo de todos os equipamentos pertencentes a estes, além disso, as previsões aqui expostas consideram sempre todos os processos de forma combinada. Separar em processos distintos e avaliar individualmente cada um trará visões que não sofrerão comprometimento devido à generalização do modelo desenvolvido, aumentando assim a acurácia individual de cada processo.

·        Variáveis exógenas não foram consideradas para este estudo, mas é possível enumerar informações importantes que podem impactar diretamente no aprendizado dos modelos, principalmente aqueles cujos dados seguem o contexto das séries temporais. São variáveis a serem adicionadas: valores de buffers antes do processo da Pintura, os buffers internos entre os sub processos da pintura e buffers após o processo da Pintura.

 

Este modelo é também expansível para outras unidades de Pintura similares, além de ser possível de ser aplicado em oficinas de Funilaria e Montagem, ou qualquer outro processo desde que possua medição de consumo energético e totalização de produção coletadas.

 

REFERÊNCIAS

 

[1] CASASOLLA, Jian Rodrigo. Técnicas de ciência de dados aplicadas à detenção de padrões de falha em processos de pintura automotiva. XI Congresso BRasileiro de Engenharia de Produção, 2021.

 

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